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Chile: uma lei integral de comunicações, outro dos desafios de Bachelet

Nessa primeira década, o Chile aparecia frequentemente nos relatórios de organismos internacionais não somente pela falta de pluralismo e diversidade informativa, mas também por graves atentados à liberdade de expressão…

Faride Zerán*. Chile, mayo 2014.

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Já é lugar comum que ao falar da situação chilena em distintos âmbitos a palavra concentração econômica se repita com frequência. Na riqueza, na distribuição de renda, no banco, no comércio, nos operadores de cabo, na telefonia e, é claro, nos meios de comunicação. A intensa concentração da propriedade dos meios e a dificuldade de ampliar as margens do campo para que participem mais e diversos atores no ecossistema midiático é uma característica do espetro de meios de comunicação chileno que não foi modificada substancialmente desde o início da transição política para a democracia, nos anos 90.

De fato, nessa primeira década, o Chile aparecia frequentemente nos relatórios de organismos internacionais não somente pela falta de pluralismo e diversidade informativa, mas também por graves atentados à liberdade de expressão.

Desta maneira, como parte da dívida com a cidadania dos quatro governos da Concertação de Partidos pela Democracia (1990-2010) podemos assinalar: o fechamento sistemático de meios independentes por falta de aviso, em um país onde os estudos confirmam o viés ideológico conservador do empresariado na hora de escolher onde anunciar seus bens e serviços; a crescente concentração de propriedade – vertical, horizontal e como conglomerados – na participação no mercado publicitário e no mercado de audiências, em todas as indústrias (imprensa, rádio e televisão, ao que se somaram as telecomunicações); e a inexistência de meios públicos.

Isso, não somente pela natureza da transição, que defendia virar a página em matéria de verdade e justiça nas violações a direitos humanos cometidos pela ditadura, entre outros pontos. Além disso, pela hegemonia do discurso da elite político que sob a premissa de “a melhor política comunicação é a que não existe”, assumiu que o mercado devia regular tudo, incluído o direito à comunicação.

Daí que na última campanha presidencial de Michelle Bachelet (militante socialista, defendendo o pacto Nova Maioria que agrupa os partidos históricos da Concertação mais o Partido Comunista), sua equipe teve que tomar nota do crescente mal-estar da sociedade ante o estreito panorama midiático. Isso já vinha sendo registrado pelos relatórios do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento das últimas décadas, e ficou em evidência nas mobilizações sociais de 2011, quando diversos atores e especialistas puseram no banco da acusação a criminalização dos protestos por parte das elites governantes, mas também por meio das imagens e conteúdos (re)produzidos e postos em circulação pelos meios de comunicação, incluindo acusações de manipulação informativa dos protestos.

Neste contexto durante sua campanha, Michelle Bachelet levantou como proposta programática a criação de um canal de Televisão Nacional educativa e cultural, anunciando, além disso, seu rechaço ao veto introduzido pelo então Presidente Sebastián Piñera ao projeto de lei de Televisão Digital Terrestre que limitava o conceito de pluralismo. Bachelet anunciou também que introduziria modificações ao Conselho Nacional de Televisão, incorporando-o ao Ministério da Cultura e Patrimônio (ainda não criado) para ampliar suas atribuições “mantendo seu papel regulador da televisão aberta e enfatizando seu papel de fomento à qualidade da indústria televisiva”.

Nesta linha também se apontava o envio ao Congresso de um projeto de lei com modificações sobre a televisão pública, algo que não aconteceu, mas que não mudaria substancialmente a que já existe.

No entanto, nada se falou ainda sobre o direito à informação e à comunicação como um eixo central para fortalecer a democracia, o pluralismo e a diversidade. E menos acerca da necessidade de enriquecer o debate cidadão por meio da criação de novos espaços de informação e debate; ou sobre uma lei de comunicação que efetivamente estimule a criação de outros que deem conta da diversidade do país.

Uma lei capaz de ver todos estes aspectos em conjunto, incluindo o destino de 60 milhões de dólares que o Estado gasta anualmente em anúncios e campanhas públicas. Milhões que, em definitivo, contribuíram para consolidar a existência de um sistema de meios de comunicação estreito e de difícil acesso para outros atores e para a cidadania em seu conjunto.

*coordenadora do Programa de Liberdade de Expressão e Cidadania da Universidade do Chile, Premio Nacional de Jornalismo 2007.

 
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