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América Latina e Caribe: liberdade dos meios

Em geral, nos últimos seis anos a América Latina e o Caribe cumpriam com as condições básicas que garantem a liberdade de expressão e a liberdade dos meios, embora a situação não tenha sido homogênea nos 33 países que conformam a região…

UNESCO*/ Regional, agosto 2014

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Panorama

Em geral, nos últimos seis anos a América Latina e o Caribe cumpriam com as condições básicas que garantem a liberdade de expressão e a liberdade dos meios, embora a situação não tenha sido homogênea nos 33 países que conformam a região. (1) Inclusive naqueles países que contam com fortes marcos legais para regular este âmbito, a implementação constitui um desafio.

Vários países latinoamericanos aprovaram novas leis sobre os meios de comunicação: para alguns, isto representa uma oportunidade para transformar a paisagem midiática em um âmbito mais plural e menos concentrado; para outros é uma oportunidade para que os governos atuem contra os meios críticos das suas gestões. Este debate também tem se refletido naqueles casos em que se tomaram medidas para revisar leis obsoletas, como as herdadas das ditaduras militares. Também tem se registrado a tendência, por parte de funcionários públicos, de iniciar ações penais contra jornalistas e meios de comunicação, ainda que na maior parte dos casos estas não tenham prosperado. Os países que historicamente têm mantido os padrões internacionais de liberdade de expressão e acesso à informação mantiveram esta tendência.

Contexto legal/regulamentar

Com exceção de um só, todos os países da região dispõe de garantias constitucionais ou de leis que protegem a liberdade de expressão quanto direito fundamental. Também, os casos de censura previa têm sido pouco frequentes. Nos últimos anos se observa uma tendência de reformulação normativa ou criação de novas leis e normas sobre os meios de comunicação. Ao menos 19 países levaram a cabo estas ações, ou anunciaram a intenção de fazê-lo. Em alguns casos, estas reformas se realizaram em contextos de conflito aberto entre o governo e a mídia, frente os quais a opinião pública tem estado dividida. Os críticos sustentam que em alguns países a nova normativa está sendo crescentemente utilizada para restringir as vozes opositoras através do fechamento de meios de comunicação, enquanto as autoridades afirmam que estes fechamentos respondem à falta de cumprimento das normas de transmissão pelo rádio e televisão, como o fato de operar sem licença ou pela falta de pagamento de tarifas correspondentes.

Nos últimos anos, a Relatora Especial para a Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), recomendou a revogação ou a emenda daquelas leis que criminalizam o desacato, a difamação, a calúnia e as injúrias, e instou os estados a adaptarem sua legislação a fim de garantir o acesso à informação pública. Uma proposta de reforma da CIDH, apoiada por alguns países e que poderia ter enfraquecido o Escritório da Relatora Especial para a Liberdade de Expressão, foi rechaçada pela Assembleia Geral da OEA.

Em toda a região se registra uma tendência à descriminalização da difamação, e três dos sete países que realizaram esta mudança nos últimos anos são caribenhos. Desta forma, hoje existe una tendência pela abolição das leis contra o desacato que se referem especialmente à difamação de funcionários públicos. Contudo, neste mesmo período não se registraram mudanças importantes quanto à utilização de outras penas, como a difamação civil e a calúnia, por parte de funcionários ou de cidadãos poderosos para restringir a informação sobre questões de interesse público. A Relatora Especial da OEA tem expressado sua preocupação com o uso dos delitos de “terrorismo” e de “traição”, dado que viola o direito à liberdade de expressão de quem critica os governos.

Os meios que requerem licenças para operar enfrentam uma situação de vulnerabilidade, dado que seu vencimento e renovação têm servido potencialmente para pressionar politicamente, uma tendência especialmente destacada em uma pequena quantidade de países. No caso da imprensa escrita, se tem registrado ações que se poderia utilizar para limitar a liberdade de imprensa. Assim, em alguns países, se tem aprovado novas normas relativas à importação, venda e/ou distribuição de papel-jornal que, segundo alguns críticos, abrem a possibilidade de intervenção indireta do governo na imprensa escrita. As rádios comunitárias têm tido importância em alguns países devido à transmissão de notícias e programas locais nas línguas vernáculas, mas só nos últimos anos começaram a se beneficiar com os marcos legais-regulatórios.

A internet se transformou de maneira crescente no foco de atenção de diversas iniciativas legislativas, tanto através de medidas específicas para esta plataforma como para todas as plataformas de meios. Em muitos casos também se interpretou que a legislação existente cobre os casos relativos à internet. Estas tendências podem ser observadas nos projetos de lei que buscam proteger os direitos autorais através da eliminação de determinados conteúdos, nas solicitações realizadas pelo governos para que se eliminem esses conteúdos, e nas ações judiciais que limitam e restringem o acesso a conteúdos considerados ofensivos ou que impõem penas de prisão a jornalistas ou blogueiros por obter e publicar informação “secreta”. Estas poderiam ser sinais da emergência de uma tendência à censura da informação publicada on-line.

Alguns países incluíram disposições relativas ao uso e acesso à internet em suas leis gerais para os meios de comunicação. Na maioria dos países da região, se tem debatido a inclusão de legislação que permita a possibilidade de filtrar conteúdos, embora no momento têm sido favorecidos os grupos que aspiram obter maior abertura. Na região persiste a tradição de filtrar conteúdos relacionados com a pornografia infantil. Naqueles casos que poderiam ser incompatíveis com os padrões internacionais, os principais motivos alegados na hora de eliminar conteúdos têm sido questões políticas, de difamação e de direitos autorais, apesar da ausência generalizada de legislação que permita estas ações. Por outro lado, tem urgido uma tendência compensatória de adoção de uma legislação proativa para a codificação de direitos na internet. Assim, em 2010, o Chile foi o primeiro país da região a aprovar disposições legais para garantir a “neutralidade de rede”, e o Brasil desenvolveu um Marco Civil de internet que apresentou ante o Congresso.

Os meios da América Latina e Caribe praticam o jornalismo investigativo, embora exista uma grande variedade de qualidade e impacto do trabalho, de acordo com o tamanho dos meios de comunicação e do lugar de produção. Este tipo de jornalismo tem sido mais frequente nas empresas de mídia localizadas em grandes capitais, em parte devido à falta de treinamento formal dos jornalistas que trabalham nas áreas rurais e remotas. Em geral, na região continua havendo meios com capacidade suficiente para levar adiante um jornalismo investigativo sobre interesses privados e públicos. Em anos recentes, as associações dedicadas a este tipo de jornalismo se transformaram em organizações chave no esclarecimento de histórias de interesse público e para facilitar recursos aos jornalistas. (2)

Por toda a região se tem reconhecido o direito à proteção das fontes, fomentado também pela Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão, da CIDH, e pela Declaração de Chapultepec da Sociedade Interamericana de Prensa (SIP). A maioria dos países da região dispõe de proteção legal para as fontes, e seis deles incluem este direito em suas constituições nacionais. Contudo, este tipo de leis não existem nos países do Caribe.

Por outro lado, registra-se uma forte tendência a uma maior transparência na região. Nos últimos seis anos promoveu-se a elaboração de leis de liberdade de informação (LdI) de maneira sustentável, e em seis países estas leis foram aprovadas, o que faz com que o total regional hoje chegue a ao menos 18 países, incluindo 5 países do Caribe. Ainda que em muitos países existissem mecanismos legais que garantiam este direito, as novas leis contribuíram para colocar estes mecanismos sob um único guarda-chuva, outorgando-lhes coerência e ampliando seu alcance. A OEA elaborou uma lei modelo sobre o acesso à informação, com o objetivo de “proporcionar aos Estados os fundamentos legais necessários para garantir o direito ao acesso à informação”. Ademais, a região mostrou seu apoio à Aliança para o Governo Aberto, uma estratégia global que conta com apoio governamental, dirigida a fomentar uma cultura da transparência. Desde 2011 até hoje, um total de 15 países da região deram seu respaldo a esta iniciativa. As leis e iniciativas de transparência geraram maiores oportunidades para levar a cabo um jornalismo de qualidade na região.

Gráfico 1

Proporção de Estados Membros com leis de liberdade de informação (LdI): América Latina e Caribe

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Fontes: Consensus list of 93 countries with freedom of information laws or the equivalent, www.freedominfo. org (marzo de 2013); Fringe Special: Overview of all FOI laws, Vleugels, R. (30 de septiembre de 2012); List of Countries with Access to Information (ATI) Provisions in their National/Federal Laws or Actionable Decrees, and Dates of Adoption & Significant Amendments, Open Society Justice Initiative (março de 2013).

Contudo, foi registrada uma lacuna entre as leis de liberdade de informação e sua implementação. Assim, parece surgir uma tendência da parte dos governos a adotar LdI ou leis de acesso à informação, para logo tentar diluir ou debilitar essas medidas. Em termos gerais, esta situação tem sido desigual ao longo da região. Em 2012, a Colômbia se transformou no primeiro país que outorgou uma qualificação a si mesmo, através da criação do Índice de Liberdade de Expressão e Acesso à Informação.

 

*Fragmento do informe Tendências mundiais em liberdade de expressão e desenvolvimento da mídia: situação regional na América Latina e Caribe. UNESCO, 2014.

 

Notas
  1. Segundo uma análise longitudinal elaborada a partir de dados de pesquisa de Freedom of the Press, nos últimos seis anos se reduziu a quantidade de países da região com sistemas de meios de comunicação “Livres” e “Parcialmente livres”, enquanto que aumentou a quantidade de países com sistemas de meios classificados como “Não livres”.
  2. Por exemplo, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, criada no Brasil em 2002; o Centro de Investigação e Informação Jornalística, criado no Chile em 2007; a Fundação MEPI, criada no México em 2010; e Praça Pública, criada na Guatemala em 2011.

 

 

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