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O direito à liberdade de expressão tem seu reconhecimento negado pelas normas secundárias da América Central

“Na América Central, o direito à liberdade de expressão e o direito à comunicação têm como obstáculo um marco jurídico insuficiente e que avança em sentido contrário à tendência democrática experimentada atualmente em muitos países do continente americano.”

Oscar A. Pérez (*)/ Centroamérica, abril 2015

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Ninguém duvida que a concentração de propriedade dos meios de comunicação em oligopólios midiáticos comerciais na América Central só é possível porque existem marcos jurídicos que facilitam e promovem essa concentração. O laissez faire, ou que cada um faça o que queira, continua sendo um comportamento constante que predomina nos países da região quando se trata da administração de um bem que é patrimônio da humanidade: o espectro radioelétrico.

Pior ainda: o reconhecimento do direito à liberdade de expressão como direito humano – que é aceitado por cada uma das Constituições políticas da América Central – é claramente negado pelas normas secundárias dos países da região. É uma situação que avança em sentido contrário à qualidade das nossas democracias.

Estas conclusões são parte da análise realizada sobre a situação atual das políticas públicas e dos marcos jurídicos na Guatemala, em Honduras, na Nicarágua e em El Salvador, e que tem como objetivo ajudar a promover a democratização das comunicações, e a reinvindicação do direito à comunicação, fundamentalmente, a partir da perspectiva das rádios comunitárias da região.

“Poder e Meios na América Central. Construindo políticas públicas cidadãs” é o nome do livro, que pode ser baixado no site www.voces.org.sv. A obra tem como objetivo geral “promover e incidir sobre políticas públicas e marcos jurídicos que facilitem a participação cidadã na reivindicação do Direito Humano à comunicação, como condição fundamental para contribuir para a qualidade da democracia na região, por meio de processos que complementem o trabalho dos defensores e das defensoras dos direitos humanos e dos e das jornalistas comunitários/as”. A publicação foi possível graças ao patrocínio da Fundação Comunicándonos, com recursos financeiros do Fundo Holandês de Direitos Humanos, administrado por ICCO Cooperação da Holanda, apoiado pela Embaixada dos Países Baixos na Costa Rica.

Deve ser destacada, nos quatro casos analisados, a carência de estudos sobre a radiodifusão e o poder do Estado na região centro-americana, ao menos a partir da perspectiva da política e das leis, e que diferentemente de estudos anteriores, os artigos produzidos nos quatro países têm como foco os efeitos e problemas gerados pelas leis no tema da radiodifusão e as políticas realmente adotadas nesse campo, indo além de declarações ou publicações oficiais. O trabalho trata de ir mais adiante do texto frio da lei e de promessas estabelecidas em documentos de políticas públicas.

As conclusões do livro nos indicam que na América Central, o direito à liberdade de expressão e o direito à comunicação têm como obstáculo um marco jurídico insuficiente e que avança em sentido contrário à tendência democrática experimentada atualmente em muitos países do continente americano. Na base desta dívida com o respeito aos direitos humanos está o sequestro da palavra, do som e da imagem, que vem prevalecendo inalterado ao largo da história da região e que vem permitindo que os oligopólios midiáticos comerciais – agora com um enorme poder político e econômico – explorem comercialmente, e com muita liberdade, os recursos que permitem que se disfrute do direito à liberdade de expressão e o direito à comunicação, como o espectro radioelétrico. Tampouco existem normas secundárias sobre a publicidade oficial, nem o reconhecimento da radiodifusão comunitária, nem um conjunto de regras de proteção para os e as jornalistas.

Estes oligopólios midiáticos comerciais que mantêm claras ligações diretas e um cruzamento de interesses com os grupos de poder político e econômico dentro e fora da região têm se dedicado a fabricar e difundir mitos que sejam socialmente aceitos como verdades absolutas; um deles é que a liberdade de expressão não precisa de regras nem de normas, já que essas limitações iriam contra o sistema de liberdades próprio de uma sociedade que esteja dentro do modelo de economia de mercado. Este argumento tende a mimetizar a liberdade empresarial com o direito humano à comunicação dentro da lógica de mercado. Sob a lógica comercial, não é difícil explicar que na América Central as normas jurídicas não regulam a comunicação como um direito humano; longe disso, o marco jurídico se colocou a serviço dos oligopólios midiáticos comerciais, afetando ostensivamente a pluralidade de vozes na região.

Particularmente para o caso salvadorenho, é indiscutível que seria primordial adotar uma Política Nacional de Comunicação e adequar as leis sobre a radiodifusão, particularmente a Lei de Telecomunicações, sob a perspectiva dos direitos humanos, com o objetivo de contribuir para a construção de uma democracia de qualidade sobre as bases dos parâmetros internacionais apresentados e já reconhecidos pelos mesmos governos da região. Com relação à Guatemala, há a necessidade de realizar processos de conciliação tanto local, quanto nos departamentos e nacionalmente, que permitam que as atuais áreas de cobertura das rádios comunitárias sejam respeitadas ao máximo, sem que elas interfiram nas emissoras legalmente constituídas; por outro lado, há também a necessidade urgente que se estabeleça por lei uma reserva do espectro radioelétrico para uso comunitário. Já em Honduras, o que se vê é uma dívida do Estado com a democracia, uma vez em que não há o reconhecimento do direito à Comunicação em sua Carta Magna, e isso se traduz na falta de acesso à comunicação e na discriminação dos setores sociais, comunitários, aos povos indígenas e aos negros, que são isolados desse direito. Por último, mesmo que a Nicarágua conte com uma política pública de comunicação, a realidade do setor permite deduzir que a implementação da política tem sido bastante limitada, e não tem sido aproveitada nem para desenvolver as comunicações no país, nem para consolidar sua democracia.

O livro “Poder e Meios na América Central. Construindo políticas públicas cidadãs” exibe com muita preocupação a firme tendência que existe na América Central a uma maior concentração da propriedade dos meios de comunicação em oligopólios midiáticos comerciais. É uma preocupação que cresce na medida em que os processos de digitalização das comunicações, já empreendidos na América Central, apontam na direção de aumentar ainda mais a concentração dos meios em mãos de poucas empresas ou famílias, afetando diretamente a qualidade da nossa democracia.

Os resultados apresentados por este importante livro não oferecem um panorama animador para a sociedade centro-americana, sobretudo porque as autoridades encarregadas de conduzir este processo de transformação ou de convergência tecnológica buscam digitalizar a rádio e a televisão com os mesmos marcos jurídicos que levaram à concentração da propriedade das frequências em poucas mãos.

Sendo assim, é urgente que os governos e os legisladores e as legisladoras de cada país da região se concentrem e deem um novo rumo à digitalização das comunicações, o que não é um assunto meramente técnico, mas profundamente político, que tem a ver com o futuro das novas gerações na América Central. Ainda estamos em tempo de mudar este caminho, enviesado pelas associações e confederações de rádio e televisão, pois a multiplicação de canais ou as frequências resultantes do dividendo digital devem ajudar a modificar o atual mapa dos meios na região. A digitalização das comunicações é uma grande oportunidade tecnológica para nossos povos, mas também pode se converter em um terrível pesadelo para nossa gente se deixamos que continuem legislando a favor dos interesses dos oligopólios midiáticos comerciais.

Em nome da saúde e da qualidade das nossas democracias, é imperativo que a classe política e a sociedade civil da região trabalhem por um mapa de mídia mais plural, no qual possamos fortalecer e promover a liberdade de expressão com os três setores com os quais fazemos comunicação: público, comercial e comunitário, para poder, assim, disfrutar da comunicação como um direito humano. É apenas uma questão de vontade política o que se necessita para iniciar a democratização das comunicações na região.

(*) Presidente-Diretor da Fundação da Comunicação para o Desenvolvimento (Comunicándonos), Representante da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC) na América Central e membro do Conselho Cidadão pelo Direito Humano à Comunicação de El Salvador.   

Link relacionado:

Os monopólios da verdade. Decifrando a estrutura e a concentração dos meios na América Central e na República Dominicana. (Em espanhol)

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